Papê! Papelaria

– Corram todos, corram por suas vidas. – Druyan, o pequeno Gremlin berrava enquanto corria. – Golems! Os Golems estão vindo!

 Todos os moradores da pequena aldeia conseguiam ouvir de longe aqueles gritos estridentes. Pouco tempo depois estavam todos os elfos para fora de suas casas tentando entender o que estava acontecendo:

– Golem? Ele disse Golem?

– Foi o que ouvi também.

– Golems não existem nessa parte do mundo, ele deve estar louco.

– Mesmo se existir, ninguém consegue atravessar nosso portal encantado. Não sei porque ele se desesperou tanto.

Druyan vivia na aldeia já havia muito tempo. Desde que deserdou dos outros Gremlins na batalha deThyrn, foi acolhido pelos elfos e vivia tranquilamente com eles. Ele adorava o estilo de vida dali; os elfos passavam o dia conversando em volta do lago, ou colhendo flores nos jardins para enfeitar suas casas, e raramente estavam trabalhando em alguma coisa, mas quando o faziam, todos se ajudavam. Ali não tinha dinheiro, e quase tudo que precisavam era produzido por encantamentos e magias. Ali não tinha mansões, nem castelos, nem torres. Apenas suas casas simples de madeira, algumas encravadas nas encostas dos montes. Tudo ali era colorido, com o verde da natureza e o azul do céu e do lago predominando. A aldeia tinha sido encantada há muito tempo por doze anciões, sendo sete magos e cinco alquimistas, que criaram um portal no espaço-tempo por onde apenas saia ou entrava quem soubesse a combinação élfica. Por isso, ninguém se importou muito com a notícia trazida pelo Gremlin, que após percorrer a aldeia toda gritando voltava desesperado.

– Vocês não vão fazer nada? Não temem os titãs de pedra?

– Ninguém pode entrar em nosso mundo,Druyan, se acalme!

– Não teria tanta certeza assim. Eles podem ter se aliado com os bruxos de Dargoroth.

– Muito difícil isso acontecer, e mesmo se fosse o caso, nenhum bruxo seria capaz de quebrar o encanto dos doze anciões. E como foi que você ficou sabendo desses Gremlins?

– No cristal de vigilância externa, na casa do velho Arwald.

O velho Arwald era um dos responsáveis por verificar como andava o mundo fora do portal. Seu cristal funcionava como câmeras que vasculhavam arredores das entradas para a aldeia.

Ali perto, Eryan trançava as hastes de vime de seu balão quando outro elfo se aproximou:

– Vejo você o dia todo mexendo nesse balão, você não sabe fazer outra coisa?

– Balões são minha grande paixão.  – Respondeu ele, tímido.

– Um elfo deve ter alguma habilidade, e voar de balão não é uma delas. Você sabe atirar flechas? Fazer magia ou tem noções de alquimia?

Eryan apenas balançou a cabeça negativamente.

– Então precisa aprender. Voar pode ser divertido, mas é inútil.

Algum tempo depois, foi o próprio Arwald quem andava apressado com o semblante preocupado. Se dirigiu até o templo dos anciões onde já estavam todos em volta da mesa oval lhe aguardando.

– Estão lançando encantamento nos portais de entrada. Os bruxos recrutaram mercenários trolls, goblinse orcs, além de controlarem um exército de Golems. Devem ter vindo buscar o talismã de esmeralda.

Em pouco tempo os anciões já tinham traçado o plano de defesa:

– Os magos vão para os portais para reforçar o encantamento, os alquimistas vão para os porões que temos muito trabalho pela frente. Os arqueiros ficam em seus postos e avise todos os moradores para se protegerem em suas casas.

Eles sabiam que as coisas poderiam sair do controle, por isso preferiam se prevenir.

Dois dias se passaram e no entardecer do terceiro ouviram um barulho ensurdecedor como um trovão, seguido de um lampejo e um barulho amedrontador do exército dos Golems. Isso significava que os bruxos tinham conseguido atravessar o portal juntamente com seus mercenários. Eles marcharam até o centro da cidade e em poucas horas construíram uma torre bem alta onde prenderam os anciões. Em seguida colocaram fogo no pé da torre.

Os elfos não acreditavam que aquilo estava acontecendo. Eles sabiam que o talismã seria encontrado e que a aldeia seria completamente destruída depois, mas nada podiam fazer. O fogo subia e as chamas já lambiam a parte da torre onde os anciões estavam, quando um balão surgiu por trás da encosta e se aproximou da torre, lançou uma escada e os anciões começaram a subir por ela. Quando os bruxos viram gritaram para os mercenários lançar suas flechas e derrubar o balão, mas os anciões conjuraram um pequeno terremoto que fazia com que eles não conseguissem mirar. Os bruxos então furiosos entraram no templo dos anciões e encontraram facilmente o talismã de esmeralda. Com aquele artefato eles seriam imbatíveis. Agora só restava destruir a cidade e encontrar os anciões que tinham desaparecido com o balão. Assim que tocaram no talismã, porém, sentiram as ondulações cósmicas do espaço-tempo os aprisionando e no momento seguinte estavam em outra dimensão com seus mercenários. Ao perceberem a armadilha que tinham caído, correram para procurar o portal de saída, mas os anciões tinham removido todos os portais, deixando eles presos em outro espaço-tempo, para sempre. 

Aos poucos os elfos foram saindo de suas casas, o balão com os anciões desceu, todos se abraçaram e uma grande festa começou. No meio da festa, um dos anciões pediu a palavra:

– Hoje foi um dia muito importante para nós, conseguimos vencer os bruxos mais terríveis que a terra do fogo já viu. Trocamos nosso talismã de esmeralda por outro enfeitiçado, nossos alquimistas passaram um dia todo fazendo ele, e os magos levaram outro dia inteiro para prepará-lo. Ainda assim, nada disso teria dado certo se nosso querido Eryan não tivesse nos resgatado em seu balão. Quando ele viu a torre sendo construída, já imaginou o que seria e correu para levantar voo, se não tivéssemos vivos o encanto não iria funcionar. Eryan agora passa a ser o mais jovem elfo a fazer parte do conselho dos anciões.

Todos aplaudiram, depois cantaram, dançaram, comeram e beberam. 

Um dos elfos se aproximou de Eryan meio sem jeito e disse:

– Queria que me desculpasse, não sabia que sua habilidade salvaria nossas vidas algum dia.

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